Pedido de condenação à prática de ato administrativo
Desde logo será devido um ato que tenha sido ilegalmente recusado ou omitido; ou seja, a Administração estaria vinculada pela lei, que impunha o dever de agir, tornando-se legítima a exigibilidade dessa atuação (pelo Autor).
O “ato devido” não deve ser considerado um ato pré-determinado ou estabelecido na lei, mas qualquer ato (ainda que discricionário), que devesse ser praticado pela Administração.
Isto significa que uma decisão judicial de condenação à prática do ato devido não terá o mesmo alcance em todas as situações.
Verifica-se assim, que a condenação à prática do ato devido, tanto pode incidir sobre a um dever de decidir (numa situação em que continua a existir discricionariedade na tomada de decisão) como poderá incidir sobre um ato de conteúdo determinado (que vincula a Administração a decidir no sentido que tiver sido determinado pelo Tribunal).
Pressupostos processuais (artigo 67º, nº1 CPTA):
Requerimento: a propositura da ação administrativa de condenação à prática de um ato pressupõe, nos termos do artigo 67º, nº1 CPTA, que já tenha sido previamente apresentado requerimento dirigido à autoridade administrativa competente para prática desse mesmo ato. Está aqui em causa o requisito do interesse processual[1], ou seja, um interesse prévio ao motivo (nos termos do artigo 67º, nº1, que fundamenta a propositura da ação.
No anterior (agora revogado) artigo 47º, nº2, alínea a) o pedido de condenação à prática de ato administrativo poderia ser cumulado com o pedido de declaração de nulidade, anulabilidade, ou inexistência do ato administrativo. Assim, teríamos um ato de conteúdo positivo, que no entanto não correspondia à expetativa jurídica do interessado; este por sua vez pretendia que o mesmo “desaparecesse” e deixasse de produzir os seus efeitos na sua esfera jurídica, pedindo a condenação à substituição desse ato por outro[2]. No atual CPTA essa possibilidade mantém-se no seu artigo 4º, nº2, alínea c). Parece que este preceito, que consagra o princípio da cumulatividade de pedidos[3] veio pragmatizar e ampliar a faculdade de que os interessados dispõem de unir os pedidos, bastando para tal, que exista uma conexão material (“relação de prejudicialidade ou de dependência, nomeadamente por se inscreverem no âmbito da mesma relação jurídica material”). Mário Aroso de Almeida entende que neste caso, não seria necessário apresentar requerimento na medida em que, o interesse processual surge implicitamente no momento em que o autor deduz o pedido de impugnação do ato administrativo em causa[4], como veremos a nova norma que consta da alínea b, nº 4 do artigo 67º vem expressamente dispensar o interessado de apresentar o requerimento.
Também nos termos do artigo 68º, nº1, alínea a), nos casos em que seja o Ministério Público a deduzir o pedido, dispensa-se a apresentação prévia de requerimento à entidade competente (afastando-se assim a regra geral constante do artigo 67º, nº1), desde que, “o dever de praticar o ato resulte diretamente da lei e esteja em causa a ofensa de direitos fundamentais, a defesa de interesses públicos especialmente relevantes ou de qualquer dos valores e bens referidos no nº2 do artigo 9º”. Vem-se reforçar a razão de ser da norma prevista no artigo 67º, nº4, alínea a); em princípio, o interesse em agir corresponderá ao interesse em que a lei seja cumprida, existia um dever que era imposto pela lei e não se verificou e isso é fundamento suficiente para que o Ministério Público possa intentar ação de condenação quando se trate de uma violação de direitos fundamentais e outros igualmente relevantes sem que para isso tenha requerido previamente à Administração.
Silêncio ou decisão negativa (artigo 67º, nº2 CPTA):
Além do requisito da apresentação de requerimento à autoridade competente (nos casos que enunciámos) prevê-se ainda que estejam cumpridos três requisitos (não cumulativos):
- Não tenha sido proferida decisão dentro do prazo estabelecido: este requisito corresponde ao anterior regime do "indeferimento tácito" que constava do artigo 109º do "velho" CPA, e que previa que deveriam ser tidos indeferidos (pelo interessado) os atos administrativos que não tivessem sido praticados dentro do prazo previsto. Era necessário ficcionar o "indeferimento" para que então se pudesse impugnar o mesmo (uma vez que antes nem sequer existia o meio de tutela da condenação à prática do ato devido). Com a criação deste novo meio processual, a figura do indeferimento tácito deixou de fazer sentido e passou a considerar-se que a falta de decisão corresponde meramente a uma omissão, que por sua vez fundamenta e constitui o requisito do interesse em agir, para que se possa deduzir o pedido de condenação à prática do ato omitido. Excepcionam-se destes casos, as situações em que o silêncio leva ao deferimento tácito (artigo 130º CPA).
- Tenha sido praticado o ato de indeferimento (expresso) ou de recusa de apreciação do requerimento: não há muito a acrescentar para a letra da lei, aqui prevê-se o caso em que se pratica um ato de conteúdo positivo que não satisfaz a pretensão do interessado; quanto à recusa de apreciação do requerimento trata-se aqui de um ato de conteúdo negativo que releva na medida em que, reflete a indiferença prática (para efeitos de dedução do pedido) existente entre a recusa liminar e a pronúncia sobre o "mérito da pretensão do interessado".
- Tenha sido praticado um ato de conteúdo positivo (que não satisfaça integralmente a pretensão do interessado): este último requisito é uma “novidade” introduzida pelo novo CPTA e que terá como fundamento a prevenção de situações como a que enunciámos acima, ou seja, situações em que a Administração praticou o ato no prazo legalmente previsto, o seu conteúdo é em sentido favorável ao interessado, mas ainda assim não satisfaz totalmente a sua pretensão (o Professor Vieira de Andrade utiliza o conceito de indeferimento parcial). Fazemos aqui uma crítica quanto à redaçao desta nova norma: o conteúdo deste artigo 67º, nº1, alínea c) parece-nos bastante semelhante ao do nº4 do mesmo artigo, podendo suscitar algumas dúvidas na medida em que, apesar de tratar o mesmo problema (existência de um ato de conteúdo positivo e no entanto não satisfatório da pretensão do interessado), no caso da alínea c) do nº1 é requisito obrigatório que tenha sido apresentado requerimento, e na alínea b) do nº4 (o chamado indeferimento indireto) esse requisito é dispensado. Parecem ter sido criadas duas regras para a mesma situação: na realidade, num caso ou noutro o que o autor pretende é que seja praticado um novo ato administrativo, que produza o efeito por si pretendido, então porquê obrigar à apresentação prévia de requerimento por um lado e por outro dispensar o mesmo? Parece que apenas poderemos compreender esta opção do legislador se considerarmos que a alínea b) vem completar o sentido da norma acima referida (artigo 4º, nº2, alínea c), ou seja, se entendermos que apenas se dispensará o requerimento quando haja cumulativamente um pedido de anulação ou nulidade do ato administrativo praticado, pelos motivos já acima referidos.
Prazos (artigo 69º CPTA):
Este prazo varia consoante estejamos perante um caso de inércia da Administração ou perante um indeferimento (ato de conteúdo negativo)
- Inércia - a ação tem de ser proposta no prazo de um ano, a contar desde a data em que o ato deveria ter sido emitido (nº1 do artigo 69º).
- Indeferimento, recusa de apreciação do requerimento ou pedido de substituição do conteúdo do ato (nº2 do artigo 69º) - o prazo é o mesmo que o fixado para a impugnação de ato pelos interessados (três meses).
- Quando esteja em causa um ato nulo relativo aos casos referidos anteriormente, o pedido de condenação pode ser deduzido no prazo de dois anos (contados desde a data do ato de indeferimento, do ato de recusa de apreciação do requerimento ou do pedido de subtituição do ato).
Cátia Martins dos Santos (nº 22023)
[1] VIEIRA DE ANDRADE, Justiça Administrativa, p.320
[2] AROSO DE ALMEIDA, Manual de Processo Administrativo, p. 317
[3] ANACORETA CORREIA, “O Princípio da Cumulação de Pedidos no Código de Processo nos Tribunais Administrativos, em Especial em Sede Executiva”
[4] AROSO DE ALMEIDA, Manual de Processo Administrativo, p. 318
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