segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

Análise dos modelos de Justiça Administrativa

Opuseram-se historicamente dois modelos de justiça administrativa, o Modelo Objectivista e o Modelo Subjectivista. Quanto à função do contencioso, o primeiro visa primordialmente a defesa da legalidade e do interesse público, e o segundo a tutela de direitos ou posições jurídicas individualizadas dos particulares. No respeitante ao objecto do processo, é um processo que versa sobre um acto ou sobre a legitimidade do exercício do poder administrativo, ou é um processo que coloca a tónica na lesão das posições jurídicas subjectivas do interessado. Consoante a entidade competente para o controlo é uma autoridade administrativa ou pode ser um juiz; dependendo do juiz, este apenas pode determinar a anulação dos actos administrativos ilegais ou possuir poderes de plena jurisdição; consoante a execução das sentenças, depende um juízo de oportunidade da Administração ou efectivamente uma vinculação da sua actuação; consoante o controlo da actuação da Administração este pode ser total incluindo a sua actividade interna ou é apenas um controlo de legalidade.
     O entendimento do Princípio da separação de poderes entre a Administração e os tribunais, o tipo e o grau de vinculação jurídica da actividade administrativa, o conceito de interesse público que engloba igualmente a consideração dos interesses privados em presença ou, as garantias fundamentais dos administrados, são demais critérios balizados neste âmbito.
     Assim, a opção actual por um modelo processual de justiça administrativa refere-se ao contexto resultante da evolução explicitada, optando-se tendencialmente por um modelo subjectivista, mesmo que não puro, em que a Administração tem o dever de executar as sentenças dos tribunais administrativos o que se traduz no facto dos modelos organizativos administrativistas estarem ultrapassados.
    
     Quanto aos Modelos Organizativos, tendo em conta o órgão a quem é atribuída a competência para decidir (órgãos da Administração activa, tribunais, ou autoridades judiciárias – estes últimos órgãos administrativos independentes, com funções de controle), conclui-se pela destrinça de três modelos base de organização ou Modelos organizativos.
     O Modelo administrativista ou modelo do administrador-juiz, de autotutela e de jurisdição reservada ou conservada, postula que a decisão final dos litígios administrativos é do poder dos órgãos superiores da Administração activa (para este modelo contribui a máxima “julgar a administração é ainda administrar”). Este é assim o modelo do Estado liberal, que encara o contencioso como um instrumento de realização dos interesses públicos estaduais, existindo uma clarividente indiferença perante o poder judicial, e defendendo-se um modelo de separação dos poderes que atribui um carácter de liberdade à Administração estadual, sujeita apenas à fiscalização política.
     No respeitante ao Modelo judicialista, a decisão das questões jurídicas administrativas cabe a tribunais integrados numa ordem judicial, segundo a máxima de que “julgar a Administração é (ainda) verdadeiramente julgar”, sendo o modelo actual, que parte do princípio de que toda a actividade administrativa está subordinada ao Direito e, por isso, sujeita a fiscalização judicial.     
     No que toca ao Modelo judiciarista ou quase-judicialista, é o modelo de jurisdição delegada ou transferida, em que a resolução dos litígios relativos à Administração é feita por autoridades judiciárias, a órgãos administrativos que, embora independentes, são alheios à orgânica dos tribunais judiciais. Trata-se de um modelo intermédio na transição dos modelos administrativistas para os modelos judicialistas.
     Há ainda Modelos mistos, sendo eles o Modelo administrativista mitigado e Modelo judicialista mitigado. Quanto ao primeiro, a decisão final sobre as questões contenciosas é apenas do poder de órgãos administrativos superiores (embora estes se designem por tribunais administrativos), ainda que esteja implícito um procedimento jurisdicionalizado premiado com a intervenção de órgãos administrativos independentes, a quem cabe dar o seu parecer em ordem a agilizar o arbítrio da actividade administrativa e, desse modo, assegurar a garantia legal dos particulares; quanto ao segundo, as decisões contenciosas são proferidas por verdadeiros tribunais judiciais, mas as sentenças por eles ditadas não têm verdadeira força executiva ou, por outro lado, esta força executiva vê-se limitada pela Administração, estando sujeita a publicação por esta, ou dependendo da boa vontade administrativa em executar.
     Conclui-se assim que, os modelos administrativistas, puros ou mitigados, já não existem actualmente tendo a maioria dos Ordenamentos Jurídicos adoptado modelos organizativos judicialistas, inquestionando-se, com a emergência do Estado de Direito social, a jurisdicionalização plena do contencioso administrativo.
     Seguidamente, os Modelos processuais ou operativos passam pelo Modelo francês (“justice retenue”) que assenta num modelo tipicamente administrativista mitigado que abarca um contencioso administrativo comum por natureza ou por definição, constituído pelo recurso de anulação de actos administrativos. Este é um recurso de mera legalidade baseado no excesso de poder ou na violação de lei, sendo também sucessivo pois pressupõe uma decisão administrativa prévia, real ou ficcionada como acto tácito ou silente. É limitado uma vez que o juiz analisa o acto administrativo, anulando ou não, sendo dificultada a execução das sentenças por parte da Administração, bem como um contencioso complementar ou por atribuição, constituído por outros meios de acção em tribunal em matéria de contratos administrativos e de responsabilidade civil, sendo este um contencioso de plena jurisdição, embora com os limites supra apontados. Contempla um regime processual de natureza peremptoriamente objectivista em que o processo é feito a um acto onde tudo se desencadeia no sentido da protecção da legalidade da actuação administrativa;
     Pelo Modelo alemão, que foi instaurado após a II Guerra Mundial, tendo recebido influências do direito anglo-saxónico, preconizando uma protecção judicial efectiva dos administrados, acabando por se traduzir num modelo judicialista uma vez que se institui a jurisdicionalização total material, processual e orgânica do contencioso administrativo, ou seja, a instituição de uma verdadeira justiça administrativa, dentro daquela que é a lógica própria comum a todos os tribunais. Neste modelo primam meios de acção de jurisdição plena quando estejam em causa direitos ou posições jurídicas subjectivas dos cidadãos, sem haver uma necessária dependência da prática de actos administratios lesivos, o que levou a uma perda da importância do recurso contencioso de anulação como o núcleo essencial do sistema. Este modelo baliza ainda a acentuação dos aspectos subjectivistas no processo administrativo, nomeadamente no que respeita aos poderes e deveres processuais das partes, aos efeitos da sentença ou à execução das decisões judiciais.

     Posto o supra analisado em sede de Modelos, dá-se por comprovada a insuficiência dos modelos objectivistas para assegurar uma protecção judicial efectiva dos direitos dos particulares, pois concluiu-se por uma não aplicação dos modelos objectivistas puros, procurando actualmente promover-se a prossecução da subjectivização da justiça administrativa. Reitere-se contudo que a finalidade da justiça administrativa, a de assegurar a juridicidade da actividade administrativa, não protege apenas juridicamente os direitos e interesses dos particulares, tutelando, senão principalmente, a garantia da prossecução do interesse público, a defesa da legalidade e, por conseguinte, também dos interesses dos particulares, sobretudo de interesses difusos.
     Nestes termos, no seguimento da opinião do Prof. Vieira de Andrade entende-se que a opção mais feliz para o legislador administrativo será uma construção normativa que contracene aspectos de ambos os modelos, assimilando as vantagens de cada um.



Marta D'Assa Castel-Branco, nº22182
Subturma 1


Sem comentários:

Enviar um comentário