O sistema germânico
assentou, desde logo, na vontade do legislador que, beneficiando da experiência
contenciosa francesa, veio a promover a redução das competências dos tribunais
comuns em matéria administrativa, de acordo com o entendimento adotado do
princípio da separação de poderes.
Nesse sentido, depois de
uma breve experiência em que era a própria Administração a quem competia a
fiscalização da legalidade administrativa, é instituído, mais tarde, em 1863,
tribunais administrativos de círculo que tinham como função o controlo da
atividade administrativa por órgãos independentes, consolidando a ideia de
separação do poder administrativo do poder jurisdicional.
A evolução dos tempos
trouxe consigo, após vários desenvolvimentos doutrinais, a necessidade de aperfeiçoar
esse princípio de que competiam a órgãos próprios, os tribunais, a fiscalização
da atividade administrativa, sendo aprovado, em 1875, na Prússia, uma lei sobre
tribunais e processo administrativo, que reforçou a autonomia do controlo dos
tribunais administrativos em litígios que versassem sobre matérias
administrativas.
No entanto, essa desejada
autonomia não estava, na verdade, completamente conseguida, uma vez que dentro
do sistema jurisdicional administrativo, os membros dos tribunais de primeira e
segunda instância, mantinham, efetivamente, alguns laços com a administração,
comprometendo, desse modo, a imparcialidade e, por conseguinte, a própria
separação de poderes.
Depois de superadas
divergências doutrinárias entre perspetivas objetivistas e subjetivistas do
Direito Administrativo, entre quem defendia que o Direito Administrativo visava
um ordenamento objetivo com o escopo de realizar o bem público, e quem atribuía
ao Direito Administrativo uma função de proteção do particular face à Administração,
vinda desde o século XIX, veio a ascensão ao poder do regime nacional-socialista,
guiado por Hitler, a paralisar completamente a evolução do contencioso
administrativo como meio de proteção dos particulares.
Após esse período
conturbado da história, verificou-se a seguir à II Guerra Mundial, uma
recuperação da independência dos tribunais administrativos, vindo a ser criado,
em 1952, na República Federal Alemã, o Tribunal Administrativo Federal, que
constituía o topo do vértice do contencioso administrativo, dividindo-se a
restante estrutura contenciosa, em tribunais administrativos especiais ligados
pela via do recurso ou, organicamente, à ordem jurisdicional administrativa em
sentido estrito.
Em linha com esses desenvolvimentos, veio a
ser criado, posteriormente, em 1960, a Lei dos Tribunais Administrativos, que
veio a constituir a base legal para o contencioso administrativo.
Poderá afirmar-se, que o
pós II Guerra Mundial veio a provocar um retorno para a tendencial
exclusividade da natureza subjetivista da função jurisdicional, que veio,
contudo, a ser mitigada por influência do Direito Comunitário, considerando que
o reconhecimento da função de prosseguir o bem público não se revelava incompatível
com os princípios que norteiam o Estado de Direito.
Em relação ao sistema
germânico, verifica-se, ainda, uma peculiaridade no que confere ao intenso
recurso da margem de livre decisão administrativa por parte dos tribunais
administrativos, que não se constata com tanta acuidade nos restantes sistemas
contenciosos europeus, pondo em causa a confiança perante a Administração.
Em face disto, a
excessiva manipulação do recuso à margem de livre decisão administrativa, tem
ínsito uma certa deturpação das funções jurisdicionais dos tribunais
administrativos, conquanto que lhe é facultada a oportunidade de invadir as
funções administrativas, dada a intromissão do juiz na situação jurídica
administrativa, sendo geradora de um bloqueio à Administração quanto à
prossecução da sua própria função administrativa.
Esta particularidade
explica-se pelo período conturbado vivido que marcou profundamente a história
alemã, durante a ascensão do regime nazi ao poder e a sua destituição,
acompanhada por um longo período de existência de uma Alemanha ocupada pelos
Aliados, dividida entre a República Federal Alemã e a República Democrática
Alemã.
Relativamente a esta
situação, refira-se, porém, que tem havido oscilações na jurisprudência quanto
ao recurso à margem de livre decisão administrativa e de ser sintomático a
desarmonia entre o Tribunal Constitucional Alemão e o Tribunal Administrativo
Federal.
O mesmo se diga quanto
aos procedimentos cautelares, onde é manifesto, uma vez mais, a paralisação do
interesse público pela Administração por parte dos tribunais administrativos,
tendo em consideração que estes podem restabelecer os efeitos suspensivos da
ação quando o órgão autor do ato administrativo se decida pela execução
imediata, por interesse público ou por interesse prevalecente de um dos
interessados.
Devido aos efeitos
perniciosos que se fizeram sentir, a respeito da paralisação dos procedimentos
cautelares, na Administração, houve a necessidade de se proceder à aprovação de
vária legislação especial no sentido de combater os efeitos suspensivos da
impugnação jurisdicional de atos administrativos.
No que tange à
compatibilização com o Direito Comunitário, veio, também, na década de 90, o
Tribunal de Justiça da União Europeia a condenar a República Federal Alemã, por
violação do princípio da igualdade de aplicação do Direito Comunitário em todos
os Estados-membros, em virtude da suspensão da eficácia de um ato
administrativo como consequência automática ex lege da sua impugnação, não
tendo o Estado, para o efeito, tomado todas as medidas para assegurar o cumprimento
das obrigações decorrentes das instituições comunitárias.
De resto, à semelhança do
que se verifica nos restantes países da Europa Ocidental, é patente a
ineficiência dos tribunais administrativos, atendendo à morosidade nos
processos, desencadeada por razões que se prendem com a proliferação
legislativa, o reduzido número de juízes existentes e pelas sentenças demasiado
extensas, causadas, em parte, por uma tendencial dispersão valorativa e, por
outra parte, por uma apreciação exaustiva de todos os vícios inerentes ao ato
administrativo.
Igor Teixeira, nº 20875