Cumpre-me,
no presente trabalho, analisar o âmbito
do contencioso pré-contratual, tal como fixado no artigo 100.º da reforma atual. Vejamos em que termos procedeu o
legislador ao aperfeiçoamento da
aplicação do Código neste domínio.
Face do desuso em que caiu a expressão “impugnações urgentes” para designar os objetos destas formas processuais, o legislador procedeu à substituição da denominação que configurava no Capítulo I do Título III do Código para “ação administrativa urgente” ao invés das “impugnações urgentes”.
Coerentemente, caíram formulações normativas patentemente redutoras, inclusive a do n.º 1 do artigo 100.º do Código, que apenas dispunha quanto à possibilidade de “impugnação de atos administrativos” relativos à formação dos tipos contratuais aí elencados. Esta foi, substituída por uma formulação mais inclusiva, a saber “ações de impugnação ou de condenação à prática de atos administrativos”. Como a prática jurisprudencial revelou, os objetos dos processos urgentes extravasam, em muito, os de uma mera impugnabilidade. Questionou-se a possibilidade de o objeto do processo de contencioso pré-contratual urgente integrar pretensões diferentes das de cariz estritamente impugnatório, particularmente, as pretensões relativas à condenação à prática de ato administrativo (pré-contratual) devido. Veio, pois, a entender-se que, não obstante a ausência de uma resposta normativa expressa, se deve considerar que nada obsta à respetiva admissibilidade, assumindo-se como uma decorrência do modelo atual da justiça administrativo. Não, restam, pois, dúvidas quanto à recusa em confinar o objeto destes meios processuais urgentes a pretensões impugnatórias como anteriormente.
Atentando-se ao preâmbulo do Projeto de Decreto-Lei, quanto aos domínios em que as alterações introduzidas no regime do CPTA revestem maior relevo, que “[o] âmbito de aplicação [do contencioso pré-contratual urgente, regulado nos artigos 100.º e seguintes]é, desde logo, alargado, de modo a abranger o contencioso relativo à formação de todos os contratos compreendidos pelo âmbito de aplicação das diretivas da União Europeia em matéria de contratação pública e, por conseguinte, do Código dos Contratos Públicos”. Destas considerações é possível retirar, logo, duas inferências: o dito alargamento é, por um lado, inteiramente funcionalizado ao âmbito de aplicação das aludidas diretivas da União Europeia e ao CCP.
É de frisar que foi aprovada a Directiva 2014/23/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de Fevereiro de 2014, relativa à adjudicação de contratos de concessão, a qual tem como objeto e âmbito de aplicação, nos termos do respetivo artigo 1.º, o estabelecimento de “regras aplicáveis aos procedimentos de contratação levados a cabo por autoridades e entidades adjudicantes por meio de uma concessão, cujo valor estimado não seja inferior aos limiares definidos no artigo 8.º”. Acresce que a noção de concessão abrange, em conformidade com o disposto no n.º 1 do artigo 5.º do mesmo diploma, quer a concessão de obras públicas, quer a concessão de serviços, tal como definidas nas alíneas a) e b) do mesmo preceito, em que a tónica se coloca, como se sabe, no direito de exploração da obra ou dos serviços que constituem o objeto destes contratos.
Com a citada Directiva 2014/23/UE põe-se, então, termo à exclusão do contrato de concessão de serviços públicos do âmbito das diretivas comunitárias relativas aos contratos públicos. À luz do exposto, compreende-se, pois, que a lei tenha tido em conta esta inovação europeia, incluindo no âmbito do contencioso pré-contratual urgente o contrato de concessão de serviços públicos (no nº1 do artigo 100º atual). Por outro lado, aproveitou o legislador para reformular a redação do n.º 1 do artigo 100.º do Código, substituindo o segmento normativo anteriormente vigente relativo ao elenco de contratos “de prestação de serviços e de fornecimento de bens”, pela referência aos contratos de “aquisição ou locação de bens móveis e de aquisição de serviços”, conforme a designação legal dos citados tipos contratuais introduzida pelo CCP.
É patente que, à luz desta reforma, ficou por concretizar a recondução de todos os contratos públicos para a jurisdição administrativa. Importa, assim, assinalar, a insuficiência da solução legal (até porque o CCP uniformizou as regras de procedimento pré-contratual) vertida na redação do n.º 1 do artigo 100.º decorrente da reforma.
Do exposto resulta que, atendendo à nova formulação do artigo 100.º permanecem excluídos deste meio processual urgente os litígios emergentes de procedimentos de formação de quaisquer outros contratos que não os enunciados nesta norma, dos quais se destacam, entre tantos outros, os contratos de concessão de uso privativo, de exploração de bens do domínio público e o contrato de sociedade (a que se referem os artigos 16º,nº2, al.f) e 31º, nº3, do CCP). Também não se aplica aos litígios concorrenciais não contratuais, pois, não abrange os atos administrativos substitutivos dos contratos públicos (art.1º, nº3, do CCP).
Teremos,
portanto, um regime duplo: a ação administrativa urgente para a maioria dos
contratos públicos e a ação administrativa normal os restantes contratos públicos
(ver os novos artigos 35º e 37º a 96º do CPTA).
Ainda no nº1 deste artigo, como já referi, veio-se admitir expressamente na norma a “condenação à prática de atos administrativos” (como anteriormente se já entendia caber no seu âmbito).
Ainda no nº1 deste artigo, como já referi, veio-se admitir expressamente na norma a “condenação à prática de atos administrativos” (como anteriormente se já entendia caber no seu âmbito).
O
novo nº2 (que substitui o anterior nº3) dispõe que “são considerados atos
administrativos os atos praticados por quaisquer entidades adjudicantes (ver
artigo 2º do CCP) ao abrigo de regras de contratação pública” (ver os artigos
51º, nº1 e nº3 do novo CPTA). Este conceito legal é próximo do conceito
presente no novo artigo 148º do CPA.
Trabalho realizado por: Ana Mafalda Lameira
Trabalho realizado por: Ana Mafalda Lameira
Bibliografia:
MATOS, SARA - “Do âmbito da ação administrativa urgente”, in e-pública,
Revista Eletrónica de Direito Público, nº2, Junho de 2014
GOUVEIA, PAULO – “A nova ação administrativa de contencioso pré-contratual”, Revista julgar, nº26, 2015
GOUVEIA, PAULO – “A nova ação administrativa de contencioso pré-contratual”, Revista julgar, nº26, 2015
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